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A ENTREVISTA

  Falar de mim? O que eu posso dizer sobre mim? repete a Francisca e a jornalista sorri, então, ganhou um prémio bem conceituado, queremos saber tudo sobre si. A Francisca sorri também, está nervosa, nem sabe porque é que aceitou dar a entrevista, mas tanto o Pai como o Rogério foram unânimes ao afirmarem que seria bom para a carreira. Os seus Pais tiveram influência na escolha da carreira? insiste a jornalista, a sua Mãe era uma excelente profissional, bem cotada no mercado. Não posso negar a influência dos meus Pais, concorda a Francisca, tanto o Pai como a Mãe desafiaram-me, deixaram explorar-me todas as opções, sem nunca me sufocarem.  E isso é importante? questiona a jornalista, a Francisca pensa uns minutos, acho que sim, temos que derrapar para compreender como as coisas funcionam, saber como calcular o risco, explica. Por isso, assumir a gerência da empresa que os seus Pais fundaram é uma responsabilidade, um risco? Claro que sim, eles tinham um plano, uma estrutura que eu tenh

A MUDANÇA FIM

  A Mãe e a Avó conversam imenso, a Mãe chora também, mas não cede e não apresenta queixa. A família acha que ela deve regressar à cidade, mas a Mãe protesta, gosto de estar aqui, os miúdos têm uma vida mais saudável e não estou tão preocupada com o paradeiro deles!!! Estou indeciso, confesso ao Luís, sinto falta de certas coisas, o quê? interrompe o meu irmão, mas eu não sei explicar-lhe. O Pai também fala no assunto, mas a Mãe continua irredutível e retoma o trabalho no fim do mês. Para nós, a vida continua, colégio, festas em casas de amigos, visita ao Pai e ao resto da família. O Luís continua a ser o mesmo ser despreocupado, eu sinto que mudei e anseio por outras coisas, outra vida. Adoro viver aqui, mas não sei explicar o que me falta, o tio Edgar ouve-me atentamente, estás a crescer, é só isso, responde, vais encontrar o teu caminho, não te preocupes. Mas eu não encontro o meu caminho, começo a ficar aborrecido e a ouvir quem não devo, cometo a primeira loucura. A Mãe não gosta,

A MUDANÇA PARTE V

  A gargalhada cruel do Damião ainda ecoa quando, pálidos e trémulos nos abraçamos. Ajudo a Mãe a sentar-se, a cara está a inchar, é melhor chamar alguém, insisto, a Mãe protesta, mas eu telefono ao sócio dela, o Dr Bruno. O Dr Bruno diz que vem imediatamente, vou telefonar também ao tio Edgar, explico, a Mãe volta a protestar, eu insisto. Vou já para aí, grita o Tio Edgar e desliga antes de eu dizer ok, o Dr Bruno chega entretanto, convence a Mãe a ir ao Hospital, só para confirmar que não tens nada partido, diz e a Mãe acede. Quando ele fala em informar a Polícia do sucedido, a Mãe pede-lhe para não dizer nada, foi uma má queda, repete e tanto eu como o Luís suspiramos de alívio, queremos esquecer o incidente. O Tio Edgar chega por volta das três da manhã, a Mãe e o Dr Bruno estão a entrar em casa naquele momento, felizmente, não tem nada partido, observa o Dr Bruno, tem apenas que descansar. Eu aviso na clínica que não vais e reagendamos as tuas consultas, e despede-se. O Tio Edgar

A MUDANÇA PARTE IV

  No dia seguinte, a cena repete-se, o Damião leva-nos a lanchar e fica para jantar. Vejo que o Luís começa a ficar inquieta com as perguntas do Damião que domina a conversa ao jantar. Levanto a mesa, ajuda a Mãe a carregar a Máquina, o Damião acha graça, faz um comentário idiota e nem eu nem o Luís respondemos. Pedimos licença para irmos para os quartos, mas esta noite, abro uma excepção e deixo que o Luís entre no meu quarto. O tipo é idiota, queixa-se o Luís, mal deixa a Mãe falar!!!, encolho os ombros, deve gostar do som da voz dele, comento, mas tens toda a razão, o gajo é um idiota, não sei o que a Mãe vê nele. É nessa altura que ouvimos vozes alteradas vindas da sala, a Mãe e o Damião parecem estar a discutir forte e feio, sussurro e entreabro a porta. São meus filhos e educo-os como acho que devo, repete a Mãe e o Damião grita ainda mais alto, ouvimos um estrondo e a Mãe grita. Apressamos-nos a sair do quarto, a Mãe está em perigo, penso, o Damião deve tê-la empurrado, pois ela

A MUDANÇA PARTE III

  Adormeço, acordo já o Pai está na cozinha a preparar o pequeno almoço e noto que ele continua mal disposto. Comemos calados, silêncio continua a ser a palavra de ordem no carro, o Pai quer sempre saber quais são os nossos planos para a semana. É o que te digo, desabafo com o Luís que exibe sorridente o gesso no pulso e passa o tempo a explicar o que sucedeu, o Pai não gostou nada de ver a Mãe com o amigo Damião. Aliás, acrescento, eu também não gostei muito dele, acrescento, é muito metediço. Não achei, contraria o Luís, foi muito amável durante a viagem, sabe imenso sobre carros... Oh, cala-te, exijo, como podes ser tão infantil??? Queres tê-lo lá em casa todos os dias, a mandar em nós? A mandar em nós, a que propósito? repete o meu irmão, o que é que tu sabes que eu não sei? Mas tu és imbecil ou quê? grito, deixa-me em paz, Luís...Que mal fiz eu para ter um irmão imbecil? exclamo e deixo o meu irmão especado no pátio. Á saída da escola, encontramos o Damião à nossa espera, pensei q

A MUDANÇA PARTE II

  Mas, no dia seguinte, o Luís caí e parte o pulso e passamos a tarde na sala de espera do Hospital. A Mãe aparece acompanhada por um homem alto, de cabelo grisalho que apresenta como o " meu amigo Damião". Fico desconfiado, observo-o atentamente e ele dá conta, sorri-me e eu tento disfarçar, anuncio que vou até à cafetaria. A Mãe está nervosa, mas pede à enfermeira para falar com o médico, posso ir até à sala onde o meu filho está? pergunta, também sou médica e a enfermeira faz-lhe sinal. Na cafetaria, escolho um croissant e peço um Ice Tea, os Pais não estão a ver, posso fazer uma loucura. Tens a certeza de que podes beber isso? ouço uma voz por trás de mim, volto-me e o Damião sorri-me, faz-me sinal para o seguir. Sentamos-nos numa mesa no canto da sala, então, tu és o Amadeu, o filho mais velho? comenta, a tua Mãe diz que és um artista e eu mastigo lentamente, a tentar ganhar tempo. O Damião finge que não compreende e continua, pintas, escreves? Teatro? e eu recupero a vo

A MUDANÇA

  A Mãe está diferente... tem um novo corte de cabelo, comprou roupas mais modernas e janta fora mais vezes. O que é que tu tens a ver com isso? diz a Avó quando lhe conto, a tua Mãe também tem que viver... não queres que ela refaça a vida como fez o teu Pai? Desde que não seja um idiota como a Marina, desabafo e a Avó dá-me uma sapatada na mão, não sejas assim, Amadeu, tens que ser um pouco mais gentil com a Marina, principalmente se ela faz o teu Pai feliz! Mas eu não quero saber e o meu irmão Luís também pensa o mesmo, por isso, somos muito formais quando estamos em casa do Pai. O que é se passa com vocês? pergunta o Pai muito aborrecido, a Marina preparou um jantar com as nossas iguarias favoritas, mas apenas provamos, a Marina esteve com este trabalho todo, de fazer a vossa comida favorita e vocês pouco ou nada comeram. Ficamos calados, o Pai desiste, manda-nos para o quarto, achas mesmo que esta é a atitude correcta? quer saber o Luís, a comida não estava tão saborosa como a da M

GONÇALO E INÊS FIM

  Acabamos por ir jantar fora, encontramos uns amigos no bar e eu encanto-me com a Benedita, a irmã da Cristiana. Vê lá o que fazes, avisa a Inês, mas eu nem lhe liga e passa noite em casa da Benedita. Combinamos um encontro para jantar naquela noite, a Benedita é sexy e divertida e como dirá a Inês mais tarde, tem miolos! Uns meses mais tarde, convido-a para viver definitivamente comigo, afinal já passas aqui a maior parte do tempo, justifico meio a brincar, achas que isso é a razão para tomar tal passo? pergunta-me a Benedita, muito séria. Fico calado por uns minutos, claro que não, gosto da tua companhia, da tua abordagem à vida, identifico-me com isso, explico, acho que temos um futuro juntos! A Benedita não está muito convencida, mas aceita e passamos aquele fim de semana a embalar as coisas dela. O meu apartamento espartano torna-se mais acolhedor, sim, senhora, gosto das cores que ela escolheu, declara a minha Mãe durante o jantar que demos para celebrar, muito zen! Tenho saudad

GONÇALO E INÊS PARTE V

  Como é habitual, a Mãe tem sempre novidades, domina a conversa enquanto eu me delicio com a quiche. Estamos já a comer a sobremesa quando a Mãe começa a fazer perguntas sobre os meus planos, respondo vagamente, não tenho pensado muito no assunto, a não ser no livro de saúde mental e fico admirado quando a Mãe afirma estar preocupada. Preocupada??? Mas preocupada com o quê? protesto, estou a fazer o que eu gosto, os clubes estão a ter sucesso, estou bem financeiramente. E basta? interrompe a Mãe, não tens uma namorada fixa, não queres ter uma família, filhos? Não quero que fiques sozinho, estou a ficar preocupada... Não há razão para isso, respondo, ainda nem sequer pensei nisso...se o teu sonho é ser avó, a Sofia encarregou-se disso. A Mãe suspira, não fujas à questão, recrimina-me e levanta-se, não podes ser tão leviano! e fica amuada o resto da noite. Para ser sincero, não sei o que é que a nossa Mãe, confesso à Sofia quando a vejo na cafetaria do clube no dia seguinte. A minha irm

GONÇALO E INÊS PARTE IV

  Finalmente, voltaste ao contacto com os Mortais, ironizo e a Inês dá-me um palmada no braço, não achas que devíamos conversar sobre o que aconteceu? pergunto. Que será apenas uma memória agradável, interrompe a Inês, acho que o importante é a boa relação que temos como primos, como amigos, como cúmplices e isso eu não quero estragar. Fico em silêncio uns minutos, também acho que isso é mais importante, confesso, por isso, não falamos mais no assunto e continuamos como sempre fomos! acrescento. E isso é? pergunta a Inês e eu solto uma gargalhada, sermos estouvados até ao fim! A Inês ri-se, já sou a dor de cabeça da minha Mãe, se aumentar a parada, ela vai ficar doida!!! mas não é isso a nossa obrigação como filhos?? exclama e voltamos a rir tão alto que fica toda a gente a olhar para nós. A Inês fala de um novo projecto, eu conto-lhe a minha ideia de escrever um livro sobre bem estar mental. O que não falta para aí são livros sobre bem estar mental, contradiz a Inês, mas eu asseguro q

GONÇALO E INÊS PARTE III

  Mas, pelos vistos, a Inês desapareceu, até a Tia Carolina está preocupada, bem sei que a vida dela é agitada, diz, mas tomar uma decisão assim tão rápida sobre um projecto que ela acha duvidoso...ah, estou preocupada. A minha irmã olha-me desconfiada quando lhe conto a conversa, vá lá, conta tudo, exige, aconteceu alguma coisa entre vocês e estão arrependidos??? Sorrio, estivemos juntos e agora a Inês não me fala, conto e a Sofia dá-me um safanão, dormiste com a Inês??? Não acredito!!!! Acredito, pois foi o que aconteceu, repito, onde é que estão a cabeça? interrompe a minha irmã, quem te ouvir, pensa que é a primeira vez que primos dormem juntos, não é pecado!!! contesto. Pelos vistos, a Inês acha que sim, replica a minha irmã e abandona a sala antes de eu protestar. Não sei o que vai acontecer daqui para a frente, temos é que conversar e esclarecer o assunto, podemos decidir preservar a amizade e não continuar a ter uma relação amorosa, declaro ao primo Miguel quando o encontro no

GONÇALO E INÊS PARTE II

  Estamos exaustos quando entregamos os miúdos à Sofia, estão tão excitados que vai ser difícil adormecerem, queixa-se, mas eu e a Inês só nos rimos. A minha irmã tem sempre razões para se queixar, comento, será que não se cansa???? Deve ter sido por isso que o Dinis saiu de casa e não o culpo! A minha irmã é uma chata!!! Os meus irmãos podem ser uns chatos, mas ai das minhas cunhadas se os magoarem!!! exclama a Inês e eu encolho os ombros. Claro que o importante é o bem-estar da minha irmão, apresso-me a dizer, mas tenho consciência de que ela não tem um feitio fácil! A Inês não me responde, já adormeceu na posição fetal e eu estendo-me ao lado, adormeço também. Acho que acordamos os dois a meio da noite, trocamos carícias e beijos, mas não tenho a certeza de nada quando acordo. A Inês já não está, vejo as horas, bolas, estou atrasado para a primeira aula do dia, penso e tomo um duche rápido e saio de casa sem tomar o pequeno almoço. Só consigo comer por volta das dez, a minha aluna f

GONÇALO E INÊS

  "Se sou o original da família? Não, creio que a original é a minha prima Inês que é actriz, escritora, encenadora... faz tanta coisa que eu desisti de a seguir. E, para ser franco, a verdadeira original é a minha Mãe... Quem é que aos sessenta e tal anos entrega o negócio, um negócio bem lucrativo diga-se de passagem, e vai viajar para a Índia e para o Nepal?..." A Inês interrompe a leitura, olha para mim trocista e solta uma gargalhada, Uau, diz, quem diria que és tão eloquente? Não sabia, estou...admirada, fascinada, acrescenta. Atiro-lhe uma almofada, deixa-te de histórias, apenas respondi às perguntas, tenho que fazer publicidade ao Centro Desportivo, explico, e tu, aponto-lhe o dedo, também podes ajudar! Queres que deixes panfletos na bilheteira do Teatro? Ou na sala de ensaios? Ou no escritório da editora? goza a minha prima e devolve-me a almofada com violência. A Sofia entra nesse momento, a almofada atinge-a de raspão, mas é o suficiente para a minha irmã soltar um

ANTÓNIO FIM

  Os dias seguintes são um autêntico pesadelo, a Francisca parece uma zombie, o Gonçalo tenta manter a calma, mas descontrola-se quando fica a sós com o irmão. O António volta a pensar na Teresa, suspira, ela faz-me muito falta, saberia o que dizer, como consolar o meu irmão, murmura. O Gonçalo diz ao Pai que deixou mensagem na embaixada, a Mãe já deve ter deixado o ashrama e está quase de certeza num local com acesso à Net, diz. Mas continua a haver silêncio por parte da Teresa, o António ajuda o irmão e a sobrinha a organizar a herança que a Rita deixou, mas a cunhada foi sempre uma pessoa metódica e pouco têm que fazer. A muito custo, o Gonçalo convence a filha a voltar ao trabalho, até propõe regressar à empresa para a ajudar, mas só part-time, avisa, e apenas para me certificar que os processos da tua Mãe estão a ser concluídos.  A Francisca ri-se, tem muitas dúvidas em assumir a gerência, a Mãe treinou-a bem, há sempre aquele ponto de interrogação, compreendes? confessa ao Tio. M

ANTÓNIO PARTE VI

  A Rita ouve-o atentamente, claro que sim, falará com a Sofia, mas a tua filha é um pouco teimosa, não prometo nada, diz. O António sorri, basta que tentes, comenta, e tu, como vão as coisas? e a cunhada encolhe os ombros. O António repara que ela está a comer muito pouco, a maior parte da comida está no prato, não gostaste? Queres pedir outra coisa? pergunta, mas a Rita abana a cabeça, a verdade é que não me tenho sentido bem nestes últimos tempos, responde, marquei consulta para o médico, mas tive um projecto tão interessante que desmarquei. A Francisca não podia organizar isso? interrompe o António, pelo que diz o Gonçalo, está a tornar-se uma boa profissional, segura de si. A Francisca participou, ajudou bastante, conta a Rita, mas era um pouco complicado, eu tinha que estar presente, e interrompe-se, tem um ataque de tosse violento e o António fica preocupado. Acho melhor levar-te a um Hospital, Rita, decide, não estás nada bem! e levanta-se, pede a conta. A Rita tenta recusar, m

ANTÓNIO PARTE V

  Mas a vida continua, a Teresa vai dando notícias, parece feliz, descontraída e o António estabelece uma rotina. Acaba por passar muito tempo com o irmão, acho que não convivíamos tanto desde adolescentes, confessa e o Gonçalo ri-se. Continua preocupado com a ex-mulher, pensa que a filha está a esconder alguma coisa, mas não me quer dizer, explica ao António um dia ao jantar. Não te preocupes, aconselha o irmão, ela dir-te-a quando achar conveniente, e desvia a conversa para a decoração do escritório. Porque resolveu seguir o conselho da ex-mulher e adaptou o quarto do Gonçalo, fez um pequeno escritório, estarei no escritório presencialmente duas, três vezes por semana, justifica, mas vou desenvolver a maior parte da minha actividade aqui. O filho acha uma boa ideia, a filha teme que ele se torne um recluso e tem nova discussão com o marido sobre o assunto. O Dinis começa a ficar farto, nunca está satisfeita, queixa-se ao sogro e o António suspira-se, a Sofia parece mais filha da Laur

ANTÓNIO PARTE IV

  A Teresa parte feliz,  toda a família está presente no aeroporto, as recomendações são repetidas e tanto a Carolina como o Pedro estão preocupados. Não a podíamos proibir, diz o irmão, a Teresa é desembaraçada, vai saber como contornar os obstáculos, e a Carolina suspira. Quem continua amuada é a Sofia, ainda por cima ela e o Dinis continuam zangados e o Gonçalo é o mesmo cabeça no ar de sempre e não ajuda. Deixa a Mãe em paz, exclama, ela sempre quis fazer isto e o que interessa se tem mais de sessenta anos? Ainda bem que tenho uma Mãe atenta, cheia de energia! Tu é que pareces que paraste no tempo!!!! Calem-se, interrompe o António, porque é que não vão jantar fora? Talvez essa tensão desapareça e fiquem mais bem dispostos. Eu fico com os miúdos, levo-os ao McDonald's ou encomendo uma pizza... A Sofia abre a boca para rebater a sugestão, mas o Dinis impede-a, por amor de Deus, protesta baixinho, deixa os miúdos irem com o avô, ele precisa de companhia e de se divertir. Vamos co

ANTÓNIO PARTE III

  Não achas que a minha Mãe enlouqueceu? a Sofia está irredutível, foi muito radical e o Dinis percebeu que magoou a Mãe. Não, não acho, responde Dinis, até tenho alguma inveja, gostaria de fazer a mesma coisa, viajar sem rumo. Estás doido???? grita a Sofia, pode acontecer muita coisa, terramotos, atentados terroristas, raptos... Por amor de Deus, Sofia, interrompe o marido, és uma escritora, trabalhas numa editora, passas a maior parte do tempo a ler livros, não gostavas de ter uma aventura? Não, não quero, confessa a mulher, não sou como tu e o Gonçalo feitos no ar! e a discussão estala. Só termina quando o Dinis bate com a porta da rua e se vê na rua sem chaves do carro, da casa, sem a carteira, sem um casaco. Felizmente, o cunhado vive perto, não vai gostar muito de me ver aparecer, pensa o Dinis quando bate à porta, mas surpresa, o Gonçalo está sozinho e ri-se quando lhe conta o sucedido. Precisas de uma boa bebida, diz e passam o resto da noite a planear as aulas do mês, deitam-s

ANTÓNIO PARTE II

  A Teresa quer viajar para a Índia e para o Nepal, confessa o António num dia em que o Gonçalo aparece de surpresa no escritório e o convida para almoçar. O irmão suspira, mas ela sempre falou nisso, não sei porque estás tão surpreendido, responde, mas ela quer ficar por lá um ou dois anos, explica o António. O Gonçalo pousa os talheres, um ou dois anos a fazer o quê? questiona e o irmão encolhe os ombros, absorver a cultura, talvez fazer trabalho de voluntariado, observa, sei que tem tido grandes conversas com a Clarinha sobre o assunto. E as lojas e o serviço de catering? Isso era o sonho dela! protesta o Gonçalo, pelos vistos, o nosso sobrinho Miguel e a mulher querem mudar para cá por causa do filho e estão prontos a assegurar o funcionamento disso. Tens que admitir que nem os meus filhos nem a Francisca estão interessados em assumir a gerência, comenta o António. Pois e não há dúvidas de que o nosso sobrinho fez um bom trabalho com a quinta dos nossos Pais, concorda o Gonçalo, é

ANTÓNIO

  O anúncio do divórcio da Teresa e do António surpreende todos e é tema de conversa nos jantares de família. A Sofia e o Gonçalo não sabem o que dizer, estão tão surpreendidos como os outros, os Pais não se podem divorciar, são o exemplo de um casamento forte, solidário, comentam. Viveram juntos tantos anos e depois casaram tão discretamente, lembras-te? acrescenta a Sofia e o irmão abana a cabeça, foi há tanto tempo que se lembra de poucos detalhes. Apenas o Dinis fica calado, embora partilhe da opinião da mulher, os sogros foram sempre um exemplo de como um casamento pode resultar, o que aconteceu verdadeiramente? Mas não vamos perguntar, aconselha, pelo menos, para já. O Gonçalo abre a casa ao irmão, pelo menos, até organizar as coisas, diz o António, fica o tempo que quiseres, responde o Gonçalo. Não quero dar cabo da tua vida amorosa, observa o António, mas o irmão ri-se, estou entre namoradas e é muito raro que elas passem a noite aqui! explica enquanto abre a porta do quarto de

A QUESTÃO FIM

  O Edgar divaga muito sobre o assunto, não entendo muito bem o que ele diz sobre solidariedade e suspiro aliviado quando ele desvia a conversa. Talvez seja melhor falar com a Avó Carolina, escrevo nessa noite no diário quando estou sozinho no meu quarto. Porque na casa da Mãe, temos quartos separados, o Pai acha que é um absurdo, o Amadeu está a entrar numa idade em que precisa de espaço e não quero ter que os estar a separar por idiotices! remata a Mãe. Fecho o diário, escondo-o no sítio habitual e desligo a luz, não tenho vontade de jogar, ouço os gritos do Luís no quarto ao lado, ele não gosta nada de perder! A Mãe resolve organizar um jantar de família naquele fim de semana, até convida o Pai e a Marina. Quase tenho um ataque cardíaco quando sei, mas porquê??? Ela é uma idiota! protesto e a Mãe encolhe os ombros, o Pai escolheu-a, deve ter encontrado alguma coisa nela de que gosto e depois, é a vida dele! acrescenta. O Pai chega mais cedo, diz que tem que falar connosco e sentamos

A QUESTÃO PARTE IV

  Vocês comportaram-se como dois idiotas, diz a Inês quando nos sentamos para almoçar, tu não tinhas nada que ler o diário do teu irmão, sabes o que é privacidade? e olha muito séria para o Luís, e se não sabes, continua, tens que aprender o que é... Mas somos irmãos, interrompe Luís, e entre irmãos, não deve haver segredos! Eu não conto tudo aos meus irmãos, responde a tia, tem que haver confiança, solidariedade entre os irmãos, é um facto, se atacarem a Filipe, o Miguel, o Matias ou o Edgar, eu defendo-os até à última instância. O que é que significa isso? pergunta o meu irmão, a fingir-se confuso e eu dou-lhe uma cotovelada, sabes muito bem o que significa, não te faças de parvo! exclamo. E, tu, a Inês bate-me suavemente na mão, tu tens que controlar melhor o teu feitio, tens que aprender a escolher as tuas lutas. Sim, eu sei que o Matias e o Edgar tinham grandes lutas, o Pai ou o Miguel tinham que os separar, mas lembro-me também que este foi o conselho que eles lhe deram. Fico cal

A QUESTÃO PARTE III

  Que ideia, Luís! atalha a Marina, a nova namorada do Pai que assistiu a tudo da porta da sala e resolve dar agora uma opinião. Isso não é desculpa e ainda tens que o respeitar mais, exactamente por ser teu irmão, continua o Pai, se não se respeita a família, não se respeita ninguém! Não quero saber o que aconteceu, mas o que acabo de presenciar, não pode acontecer novamente! Por isso, hoje, não há saídas, ficam no jardim, leiam, joguem, inventem qualquer coisa, o que quiserem, mas sobretudo, pensem em como evitar este tipo de situações. O Luís protesta, mas foi ele quem começou! porque tu o provocaste, diz o Pai e o meu irmão amua. A Marina sorri-nos solidária e o Luís deita a língua de fora e eu empurro-o para o quarto antes que o Pai se aperceba. Porque é que fizeste isso? Se o Pai te visse, o castigo seria ainda maior! recrimino, eu também não gosto dela, a única coisa que podemos fazer é manter a distância! Ela é tão parva, veste-se daquele maneira ridícula e parece uma galinha a

A QUESTÃO PARTE II

  É tempo de acender as velas e cantar os parabéns, o Gustavo adora o coro, a Maria Henrique esconde o rosto no ombro do Pai e a Gabriela desata a chorar, assustada pelas vozes. Temos mesmo que os " trabalhar", sussurro, não se podem comportar assim, temos que os endurecer! Pois, concorda o Luís, temos que desenvolver um plano, caso contrário, eles ficam uns medricas e isso não existe na nossa família, acrescenta. Estamos muito cansados quando regressamos a casa, amanhã pensamos no assunto e até me esqueço de esconder o caderno de notas. O Luís acorda mais cedo, aproveita o facto de eu estar ainda enroscado nas mantas para se deliciar com as minhas observações. Acordo com as gargalhadas dele, eh, pá, não sabia que eras tão trocista! goza, mas isto de dizeres que o Edgar é um "gozão".... não sei se ele gostaria!! e ri-se. Não sei o que se passou pela minha cabeça, mas dou-lhe um murro tal que ele caí. O Luis levanta-se rapidamente, atira-me ao chão e dá-me igualmente

A QUESTÃO

  A questão que se coloca, começo e o meu irmão Luís desata a rir, vais fazer um discurso para estes bebés? aponta para os nossos primos que me olham com estranheza. Têm que se habituar, respondo, afinal, fazem parte da família e tens que concordar que somos uma família de doidos!!! Não sei porquê, replica o Luís, só se for porque a Inês é uma original, tanto está a escrever livros infantis, como a actuar numa peça. O Gustavo olha-nos curioso, a irmã e a Maria Henrique não se interessam pela conversa, parecem estar a comparar notas sobre os vestidos. O vestido da Gabriela é azul claro, provavelmente para contrastar com as jardineiras azuis escuras do Gustavo, mas a Maria Henrique parece um "pudim flan", segreda o Luís à Mãe que lhe aperta o braço, não dizes isso alto! pede. Oh, Mãe, tem que concordar que aquele vestido é exagerado! Não é nada prático! protesto e a Dra Filipa morde os lábios. Ok, talvez seja um exagera, a Matilde quis assinalar o aniversário da filha com pompa

A ENDIABRADA

  Parece que o meu sobrinho ouviu-me, pois o Matias telefona a meio da manhã a dizer que a Núria começou a ter dores e a médica disse para irem para o Hospital. Pois é, Avó, hoje vamos conhecer os novos elementos da família, troço gentilmente, mas a Mãe não acha piada e manda novo SMS aos meus irmãos. Estamos já a almoçar quando o telemóvel toca e um Miguel muito excitado anuncia o nascimento da Maria Henrique. Maria Henrique??? repito, que raio de nome!!! Não podiam ter escolhido um nome mais civilizado???? Henrique é o nome do Pai da Matilde e da Núria, explica a Mãe, e ela quis homenageá-lo. Mesmo que não se goste do nome, e tenho que confessar que só lhe vou chamar Maria, acrescenta, temos que respeitar a escolha! Abro a boca para a contrariar, mas o telemóvel volta a tocar e é o Matias a dizer que tiverem que fazer uma cesariana à Núria, mas ela e os gêmeos estão bem. GÊMEOS??? grita a Mãe, e vocês sabiam e não disseram nada??? e ouve-se o riso do Matias, queríamos que fosse uma s

A ENDIABRADA PARTE V

  Está a dizer isso para ser simpática, respondo, mas a Mãe abana a cabeça, gosto, está bem escrita, bem estruturada, Inês, isto pode ser um êxito. Duvido, porque não sei o que fazer agora, insisto e guardo o rascunho numa gaveta, mas a minha cunhada Matilde surpreende-me, ao anunciar que tem um amigo que trabalha uma editora. Tens aqui o telemóvel dele, telefona-lhe, explica, eu já lhe disse que tu tens um livro para ele ler, e como eu pareço indecisa, marca ela o numero e estende-me o telemóvel. O Alfredo, que raio de nome! penso, tão antiquado, é muito simpático e sim, editam livros infantis, estão interessados em ler a minha história. O Amadeu quer ir comigo à reunião, eu acho que é um absurdo, mas o teu sobrinho sabe comportar-se em público, exclama a Filipa, e afinal de contas, ele ajudou-te a escrever a história. O Luís também quer ir, mas todos dizem que três é demais e no dia marcado, eu e o Amadeu subimos as escadas da editora, os dois muito nervosos. Se o Alfredo e as outras

A ENDIABRADA PARTE IV

  Hesito ao ver a cara angustiada do meu sobrinho, o Luís faz beicinho e eu atiro o guião para cima do sofá. Ok, vamos ver o que escrevi até ao momento, decido, e depois vê-se. Os miúdos ficam entusiasmados, passamos o resto de tarde a discutir os eventos e só terminamos quando o Matias chega para jantar. Tudo bem, explica, não há problema em ajudar a Inês a escrever a história, mas agora é hora de tomar um banho, jantar e ir para a cama. Os miúdos ficam desanimados, mas obedecem e eu volto a sentar-me, estou exausta, confesso, ainda não posso andar por aí ao sabor do vento! Talvez seja ainda cedo para participares na peça, comenta a Mãe e o Matias olha-me surpreendido, então, estás de volta às lides da representação? É o que eu faço, repito, entusiasmei-me um pouco com a ideia de escrever um livro infantil, porque estava aborrecida... Pois, mas pediste a ajuda dos teus sobrinhos, interrompe a Mãe, agora tens que ir até ao fim... É interessante ter dois projectos activos, declaro e a M

A ENDIABRADA PARTE III

Acabo por ficar sentada no banco, os meus sobrinhos acenam-me, estão felizes e tenho que confessar que há muito tempo que não me sentia tão confortável. Adoro actuar e cantar, não posso negar, mas talvez possa explorar outra vertente da profissão. Os meus irmãos não dizem nada nem a Mãe, mas sinto que gostariam que estivesse mais perto. E tenho que confessar: nos últimos tempos, não tenho estado muito feliz, perdi aquele papel interessante para uma outra actriz da companhia e não gosto nada de trabalhar com aquele director. Foi uma relação tóxica, a nossa separação foi dolorosa, abalou-me física e emocionalmente e talvez seja por isso que estava distraída no dia em que tive o acidente. Foi o que confessei à Filipa, ela acabou por me contar a verdadeira razão porque se mudou para aquela vila simpática e eu estou a pensar que tenho que fazer o mesmo. À noite, contacto um amigo, será que me podes pôr em contacto com um grupo de teatro local? peço, para já, não quero voltar, quero ficar ma