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O GINÁSIO

  A minha decisão de abrir um ginásio preocupa o Pai, aterroriza a Mãe e a minha irmã suspira, e vais gostar de estar fechado? Pensei que ias desenvolver o Centro de Aventuras, interrompe o Pai, encolho os ombros, só é viável entre Abril e Outubro, explico, tenho um curso de Ciências Desportivas, estou a pensar em especializar-me em defesa pessoal. A Mãe volta a suspirar, tens a certeza? pergunta, é preciso dinheiro, contactos, sítio adequado? Terei que pedir um empréstimo, o Bernardo encontrou um espaço que é adequado, respondo, e a Rita e o Gonçalo encarregam-se da publicidade. Ah, ri-se a minha irmã, o Gonçalo tem um plano, quem diria que o meu irmão pensa? Tu és uma IDIOTA! grito, o Pai dá uma palmada na mesa que nos faz saltar, basta! Vocês já não tem idade para este tipo de comportamento! Nós vamos conversar sobre o teu plano de negócios, presumo que tens um? Fico surpreendido, o que é isso? penso, vejo que o Pai fica muito sério, já percebeu que estou completamente desorientado.

MADAME X FIM

  O Zé não fica muito satisfeito quando me vê aparecer, o que é que estás aqui a fazer? pergunta, isto pode acabar mal, não confio neste homem! Pois eu também não, respondo, mas quero ter a certeza de que não vais fazer asneira e dar cabo de tudo! Estás parva????  resmunga, não aconteceu antes, não vai acontecer agora! afirma, estou preparado! Encolho os ombros, não é bem verdade, mas a hora não é para discussões, fico preocupada quando percebo que só estou eu, o Zé, o Gomes, o homem de confiança dele e o Madureira presentes. O Zé costuma estar rodeado por vários segurança, a não ser que estejam escondidos em sítios estratégicos, penso, isto é uma armadilha! constato, o que é que tu descobriste, Zé? mas o Vasques chega entretanto e não posso perguntar nada. O Vasques aproxima-se calmamente, o Zé pergunta pelo dinheiro, mas o cliente abana a cabeça, exige ver as armas primeiro. Noto surpresa no olhar dele quando me vê, mas não deixa transparecer nada e isso assusta-me um pouco, é frio,

MADAME X PARTE V

  Acabo por ter uma conversa violenta com o Zé do Vento, também ele mandou seguir o novo cliente, acha que há qualquer coisa estranha no comportamento dele. Não há movimento, contactos, explica, ou pertence a outro gangue e quer tomar conta do território ou é polícia! Estás doido! respondo, temos apenas que investigar mais fundo, não foi o tal Bento quem te deu referências? Não estava tudo correcto? Estava, concorda o Zé, mas o Bento " desapareceu ", ninguém sabe dele! É por isso que acho tudo isto muito estranho. E, já que estás tão preocupada, acrescenta, vais ser tu a telefonar ao Vasques e dizer-lhe o local e a hora do encontro. Eu tenho coisas a preparar, e saí da sala. Suspiro, procuro o numero de telemóvel do Vasques, ele atende quase de imediato, discutimos os detalhes do encontro e no último instante, sou atrevida e convido-o para jantar comigo. O Vasques recusa delicadamente, compromissos familiares, diz e não sei bem porquê, sinto-me magoada. Achas que és irresistí

MADAME X PARTE IV

  Se o Vasques tem algum segredo, o Madureira vai descobrir, a Filomena acha que vou ter problemas, mas eu estou verdadeiramente intrigada pelo homem. Fico desapontada com o primeiro relatório, todos com quem o Madureira falou, discretamente, friso e ele acena que sim, são unânimes: é um homem educado, atencioso, mas mantém a distância. Não sabem no que trabalha, deve estar em teletrabalho, opinam, só saí para ir ao ginásio e fazer compras, acrescentam. E namorada? insiste o Madureira, ah, é possível que tenha uma namorada, dizem, mas nunca a trouxe cá, não sabemos quem é. Achas que isso é possível? pergunto à Filomena que está a conferir um packing list e levanta a cabeça por uns instantes. Pode viver noutro local, sugere, pode utilizar o apartamento como escritório... É melhor esqueceres o assunto, se o Zé sabe que estás tão interessada, vai haver chatices... Tento concentrar-me no trabalho, por volta das quatro da tarde, o Zé entra no escritório, quer saber como estão as " rece

MADAME X PARTE III

  Mas o novo cliente é o primeiro a partir, o Zé do Vento e o restante grupo resolve ir até ao casino, desafiam-nos, mas estamos cansadas e resolvemos ficar em casa. Vejo que a ideia não agrada ao Zé do Vento, sei que vou ser repreendida, mas pouco me importa, estou farta de sorrir, de tentar que gastem ainda mais dinheiro. Até parece que não gostas de dinheiro, comenta a Filomena quando nos sentamos na minha sala privada. Claro que sim, confirmo, mas aquele novo cliente intriga-me. Tenho que encontrar uma maneira de derrubar o " muro". É simpático, bem educado, confirma a Filomena, mas mantém as pessoas à distância. Deve ser implacável nos negócios. Eu gosto que sejam implacáveis, respondo com um leve sorriso, tenho que usar todas as minhas armas! Amanhã, temos que descobrir o que é que ele gosta, ver se o consigo apanhar desprevenido! Deve ser militar, personal trainer, sugere a minha assistente, aquele corpo musculado denota treino militar... Suspiro, amanhã, faço a minha

MADAME X PARTE II

  Quando desço, o grupo habitual já está a tomar o segundo cocktail, falam e riem alto, vai ser uma noite longa, penso. É fácil identificar o novo cliente, está parado no meio do átrio, a brincar com a bebida, mas a observar tudo atentamente. É alto, cabelo cortado à militar, porte atlético, à primeira vista, parece arrogante, quem és tu na verdade? murmuro, vou adorar descobrir quem és. Ah, Mónica, este é o nosso novo cliente, apresenta o Zé, o Sr Vasques, e ele brinda-me com um sorriso irónico. Como está? e estende-me a mão, sorrio também, um prazer, temos muito que conversar, acrescento, mas não hoje, goze a noite, e afasto-me, tenho que falar com o pessoal do catering, sussurro e desapareço no corredor. Ups! O que se passa? pergunta-me a Filomena, a minha assistente, está tudo controlado, o jantar vai ser servido dentro de dez minutos. Nada de especial, respondo, viste o novo cliente? Quem, aquele fulano de fato azul que parece um militar? repete a Filomena. Achas que ele é militar

MADAME X

  Tive muitos nomes, mas o meu nome verdadeiro é Ana Cristina. Fiz a escolha errada, a verdade é que gosto do perigo e subi a pulso. Comecei como correio, paguei os meus estudos e os dos meus irmãos que hoje não me falam. Seduzi homens para obter informações e favores, mas não gostei de nenhum e tolero o Zé do Vento, porque é um bom operacional, tem experiência no ramo e ensinou-me muito sobre a rede. Não fiquei muito satisfeita quando ele me disse que convidou o novo cliente para o jantar. O que é que sabemos sobre ele? protesto, tens a certeza de que podemos confiar nele? O tipo novo, o Bento diz que o conhece e investiguei as credenciais dele, responde o meu Chefe, há um ou dois aspectos que tenho ainda que confirmar, mas estamos seguros. Espero bem que sim, interrompo, temos uma operação muito delicada em curso, não podemos ter ninguém a atrasar-nos! O Zé do Vento sorri ironicamente, não vai haver atrasos! exclama, confia em mim! Descansa, põe um sorriso nessa cara e desce. Faço um

O CASO FIM

  No hall, estão já várias pessoas que param de conversar e observam-no com atenção. O Meireles sorri e aceita um cocktail que o empregado lhe oferece, olha em volta, toma nota mentalmente dos detalhes. Abre-se uma porta, aparece o Zé do Vento todo sorridente, cumprimenta à direita e à esquerda, aproxima-se finalmente do Meireles, que bom ter vindo! Vou apresentar-lhe algumas pessoas, convida. O Meireles sorri, segue-o, tenta apreender o máximo de informação, vai passar uns dias interessantes a deslindar esta rede. O Zé do Vento olha para o relógio, a nossa anfitriã deve estar a descer, diz, as mulheres demoram tempos infinitos a decidirem o que vão vestir, e todos riem polidamente. Sente-se uma porta a abrir, alguém aparece no cima das escadas, todos se voltam para lá. É uma mulher alta, elegante e sexy num vestido preto justo, tem cabelo ruivo preso no topo da cabeça e um sorriso perfeito. Desce tão rápido quanto os sapatos altos lhe permitem e o Meireles observa-a discretamente. Con

O CASO PARTE VI

  O Meireles reúne-se com as Chefias na tarde seguinte, dizem-lhe que o Bento teve uma crise nervosa naquela noite e está internado numa unidade hospital. A esta altura, explica o Chefe, já o gangue está ao corrente, fizemos circular a informação nos locais que ele frequenta. E, o Meireles, já fez alguns progressos? O Meireles resume os acontecimentos, fala no jantar no dia seguinte, o Chefe acha que devem actuar nessa altura, o procurador e o sargento discordam. Só quando eu for levantar as armas, interrompe o Meireles, tenho quase a certeza de que o encontro não vai ser naquele armazém e será mais vantajoso apanhar o máximo de pessoas ligadas à rede.  Também acho, concorda o procurador, o Meireles vai ao jantar, tenta conhecer o máximo de pessoas, descobrir o máximo de detalhes. Quando se confirmar a transacção, estipulamos um plano de ataque. O Chefe acaba por concordar, tenha cuidado, Meireles, recomenda quando o sargento se despede, telefone-me quando terminar o jantar, a qualquer

O CASO PARTE V

  Temos que pensar numa história e retirar o agente Bento da operação, repete o Meireles no novo email que manda às Chefias, ele está tão nervoso que poderá prejudicar o desfecho. Quem sabe se não estão ao corrente da história do colega e não utilizaram isso para o fazer ceder? acrescenta. Continua a pensar que foi um erro terem confiado uma missão tão delicada a um agente tão inexperiente, como é que vou contornar a situação? pensa o Meireles enquanto se prepara para o encontro às quatro horas. Agora não é só a vida dele que está em perigo, é a minha também, murmura enquanto estaciona a moto no parque abandonado. Não há carros estacionados, há um portão aberto, o Meireles hesita, não sabe se deve ou não entrar, decide arriscar. Há uma carrinha sem matricula e vidros escuros, o Meireles reconhece o homem que está encostado e que lhe faz sinal para entrar. O Meireles avança, observa o espaço, toma nota dos detalhes, há mais dois homens colocados em pontos estratégicos e vê ao fundo do p

O CASO PARTE IV

  Suspira, toma nota mentalmente para falar com a Madame, têm que averiguar quem este homem é e propõe que se encontrem amanhã, às quatro da tarde na zona de armazéns, no Parque Central, junto à doca, sabe onde é? pergunta o Zé do Vento. O Meireles acena que sim, sim, está familiarizado com a zona, não é a primeira vez que concluí negócios deste tipo. O Zé do Vento levanta-se, dá por concluída a reunião, aperta-lhe a mão, fique, convida, as bebidas são por conta da casa, alguém já vem falar consigo e afasta-se. Nem dez minutos, aparece uma rapariga vestida extravagante que se senta no lugar desocupado pelo Zé do Vento e sorri abertamente ao Meireles. O Meireles sorri também, já percebeu o jogo, é cortês, educado, mas na altura de dizer não, expressa-o com autoridade e a rapariga, que diz chamar-se Márcia, se fica surpreendida, esconde-o bem. Foi bem treinada, confessa o Meireles ao agente Bento quando já estão a caminho de casa, sabes quem ela é? Sim, é como se fosse o braço direito do

O CASO PARTE III

  Antes de se encontrar com o agente Bento nessa noite, Meireles envia um email às Chefias, fez o primeiro contacto, vai ao bar conhecer os suspeitos, tentar descobrir qual a melhor maneira de os abordar. Acrescenta ainda que pensa que o agente Bento está a sofrer de " burnout", terá que sair para que a operação não falhe, temos que pensar numa história plausível para justificar a saída dele. Vê as horas, decide ir de moto, é um risco bem sabe, mas ninguém pode duvidar da credibilidade dele. O bar é luxuoso, só para membros, é exclusivo, explica o Bento que se senta ao balcão com ele, mas evita dar mais informações quando o barman se aproxima. Meireles deduz que há camaras e microfones espalhadas, tenta identificar os locais mais óbvios, o Bento cruza e descruza as mãos. Tenha calma, murmura, isso vai denunciá-lo, e o agente sorri, suspira quando a porta do fundo do bar se abre, saem três homens todos vestidos de preto. O do meio é o Zé do Vento, sussurra o Bento, atenção ao

O CASO PARTE II

  Meireles acha curioso o nome de códigos dos suspeitos, mas não há muita informação. Ao que parece, a Madame X é a cabecilha, mas não têm a certeza absoluta, uma vez que o Zé do Vento tem igualmente poder na organização. Meireles suspira, tem muito que organizar, compreende agora porque o chamaram e lhe pediram para se infiltrar. Pensam que o agente que está a trabalhar na organização pode ser descoberto a qualquer momento, no fundo, querem que ele agite as águas. Como? murmura o Meireles, aparecendo como comprador, exigindo que seja o agente infiltrado a ponte entre ele e a organização. O Meireles deu provas que sabe conduzir este tipo de trabalho, disse o Chefe, sei que pensava descansar um pouco, o outro caso foi um pouco violento...mas precisamos de si! E aqui estou eu a tentar deslindar um outro caso bicudo, confessa baixinho o Meireles, a primeira coisa a fazer é conversar com o agente infiltrado e delinear um plano. Construir uma história plausível para ele conhecer a famosa Ma

O CASO

  A operação foi um sucesso, Meireles recebe um louvor, mas sente-se cansado. Está seriamente a pensar em pedir uma licença sabática, mas é promovido e transferido para a capital. Com a promoção, não sei se devo ou não pedir licença, confessa ao Inspector Bernardes, estão os dois a almoçar num restaurante perto do rio. Mereces essa promoção, interrompe o Inspector, desempenhaste um papel fundamental para a conclusão da operação. Fala com as chefias, vê o que eles dizem, não te vão negar a licença, em vez de três, podes ter só um mês... Estava a pensar em seis meses, admite o Meireles, foi um ano muito cansativo, tenho mesmo que organizar a minha vida. As minhas sobrinhas dizem que já não se lembram da minha cara, e os dois homens riem-se. Pagam a conta, o Inspector Bernardes segue para o Departamento, o Meireles foi chamado à sede. A reunião está marcada para as três e meia, mas só às quatro é que o chamam. Na sala, estão o Inspector Geral e o Delegado do Ministério Público, o que surp

O ESTÁGIO FIM

  Não sei a que horas a Maria Rosa chega, já estou a dormir, deve ter sido tarde, resmunga quando a acordo. Nas semanas seguintes, as diferenças entre nós tornam-se profundos, temos vidas separadas, os estágios e os objectivos são diferente, apenas partilhamos um quarto. Não é que me divirta, tenho um grupo agradável de amigos com quem exploro aos fins de semana a cidade e os arredores, mas a Maria Rosa raramente me diz onde vai. Fico surpreendida quando o tio Pedro me telefona, depois das banalidades como estás, estás a gostar? pergunta, E a Maria Rosa? Sabes onde ela está? Acho que hoje fica até mais tarde, sou vaga, mas fico preocupada, ela não telefona muito, nem dá muitos detalhes sobre o que faz, continua o tio Pedro, é por isso que te estou a telefonar. Mas se ela está bem...diz-lhe para me telefonar, ok? e desliga. Tento ligar para o telemóvel da minha prima, ela não me atende, se soubesse onde ela está, ia lá ter, penso, o que é que eu faço? Ouço barulho na escada, talvez seja

O ESTÁGIO PARTE VI

  O jantar é simples, o filho mais velho também está a estudar design e temos uma conversa interessante sobre o assunto. A Maria Rosa e a filha mais nova trocam impressões sobre moda e joelharia, percebo que as duas estão divertidas, pois a minha prima ri-se alto e está com os olhos a brilhar. Na manhã seguinte, acordo cedo, preparo o pequeno almoço, a família abasteceu o frigorífico com o essencial e visto-me. A Maria Rosa ainda dorme, é preciso acordá-la, ela resmunga, mas temos que nos apresentar a horas, digo, não convém chegarmos atrasadas! Cruzamos-nos com o casal no corredor, eles oferecem-nos uma boleia até à empresa, explicam o trajecto do autocarro. Não percebi nada, suspira a Maria Rosa, vais ter que me explicar ou melhor, encontramos-nos aqui à hora de saída e vamos juntas. O átrio é enorme, decorado em cores discretas, apresentamos-nos à recepcionista que toca num botão e nem cinco minutos depois, aparecem dois homens. O Karl deve ter cerca de cinquenta anos, vai ser o res

O ESTÁGIO PARTE V

  Os Pais regressam, sentam-se, a conversa fluí, até a Mãe da Maria Rosa parece mais descontraída. O Pai olha para o relógio, é melhor irmos, diz e lá vamos nós em direcção das escadas rolantes, tens a certeza de que queres ir? ouço a Mãe da minha prima perguntar-lhe. Olho para a minha Mãe, ela suspira e abana a cabeça, ela vai ficar bem, responde o tio Pedro, é uma boa oportunidade e ela vai aproveitá-la, não sei, não tenho a certeza disso, insiste a Mãe e a Maria Rosa explode, eu vou e não há nada a fazer! Fazemos o check-in, despedimo-nos dos Pais e a Maria Rosa respira fundo quando nos sentamos no avião. Pensei que ela ia ficar calada, explica, mas não, tinha que fazer uma última cena, não sabe como é ridícula? Não faço comentários, penso nos meus Pais, na sorte que tenho em os ter como Pais, extravagantes, é certo, mas acessíveis, o que é que eu quero mais? Adormeço e quando acordo, a Maria Rosa está a conversar animadamente com os nossos vizinhos, já trocaram números de telemóvel

O ESTÁGIO PARTE IV

  Acho que não te deves preocupar demasiado com isso, aconselha a Mãe quando lhe falo dos meus receios, aproveita o estágio, aprende, mas diverte-te também. Não te vais preocupar com o que a Maria Rosa vai ou não fazer, se ela tiver uma atitude de que não gostas, fala abertamente com ela! Pois... tenho a impressão de que ela aceitou fazer o estágio para estar longe da Mãe, explico e a Mãe abana a cabeça, talvez seja, mas esse não é o teu problema. Concentra-te nos teus objectivos, mas está atenta às atitudes dos outros. Suspiro, a Mãe tem razão, estou muito entusiasmada com o estágio, já enviei um mail à pessoa responsável pelo meu estágio na empresa, estabelecemos um programa que discuti com o meu professor. Os meus Pais acompanham-me ao aeroporto no dia da partida, a Maria Rosa diz que vai lá ter, espero que não chegue atrasada, resmungo e o Pai ri-se. Se bem conheço o Pedro, até já lá devem estar, diz, mas eu duvido. Contudo, quando entro no átrio principal do aeroporto, a primeira

O ESTÁGIO PARTE III

  Já passou uma hora e a Maria Rosa ainda não chegou, começo a ficar desesperada... Já sei mais ou menos o que vou comprar, até pedi para guardar, pois quero que a minha prima veja, explico e volto a sentar-me num banco perto da porta principal. Estou quase a desistir, ir buscar as coisas, pagar e ir-me embora quando a Maria Rosa irrompe esbaforida, atravessa o átrio, desculpa, desculpa, pede, mas a minha Mãe fez-me uma cena. Tive que pedir ajuda ao Pai, porque ela não me deixava desligar... Ainda por causa do estágio? interrompo, pensei que estava tudo resolvido, também eu, admite a Maria Rosa, mas a Mãe continua a ver fantasmas. Nem parece uma psicóloga, respondo, mas há pessoas que só vêem o lado negativo da situação, repito a explicação da minha Mãe. A minha prima suspira, a minha Mãe sempre foi uma exagerada, acho que o Pai pensa isso, comenta, embora seja muito correcto quando fala dela comigo. Mas eu sinto, sabes?... mas deixa lá isso, vamos comprar coisas? Levo-a até à loja ond

O ESTÁGIO PARTE II

  A Maria Rosa telefona-me nessa noite, ah, Francisca, estou tão excitada, confessa, mal posso esperar por começar o estágio... Estou a fazer uma lista do que tenho que comprar... Lá também há lojas, interrompo, escusas de ir muito carregada! Leva mas é um bom anorak, luvas quentinhas e botas forradas. Foi um conselho que a minha Mãe me deu. Pois, a tia Rita viajou por este Mundo e o outro, diz a Maria Rosa, nem sabes a sorte que tens, a tua Mãe é uma pessoa acessível....Já a minha... O facto de ser acessível não quer dizer que não se preocupe, aviso, fez questão de saber tudo o que podia sobre a empresa onde vamos estagiar e mesmo sobre a família onde vamos ficar. Tenho uma lista de coisas a cumprir...não penses que não me vai controlar...só que aborda a questão de uma outra maneira! A minha prima suspira, mas mesmo assim, persiste, a minha Mãe podia ser um pouco mais aberta! Aquele marido não é boa influência... aquela mania de controlar tudo e todos! Fico calada, não sei bem o que d

O ESTÁGIO

  Foi um escândalo, bem não diria que foi um escândalo, mas os nossos Pais não aceitaram bem a ideia de eu e a Maria Rosa fazermos um estágio no estrangeiro. Por sorte, as empresas que nos ofereceram o estágio, eu para design de mobiliário e a Maria Rosa para jóias, são na mesma cidade e podemos partilhar um quarto em casa de uma família. A Mãe da Maria Rosa foi tão agressiva que se o Tio Pedro interviesse, acho que a Maria Rosa tinha fugido. Os meus Pais extravagantes quiseram analisar a proposta feita pela empresa, fizeram umas perguntas discretas a clientes que trabalham para aquele mercado e até escreveram à família, apresentando-se. Não achas que foi um exagero? Escreverem à família, quero dizer, pergunto à Tia Teresa, não, concordo em absoluto, a família fica a saber que não estás sozinha no Mundo... Achas que me iam raptar para ser escrava sexual? interrompo e a Tia Teresa fica muito séria, não digas isso a brincar! Infelizmente, isso acontece mais vezes do que pensamos e esta f

O DIÁRIO DO BÉBE FIM

  Tentar saber se a minha Mãe ficou numa dessas cidades revela-se um processo moroso, o Pais não tem representação diplomática, explica o tio Gustavo, temos que pedir ajuda às ONG que estejam a trabalhar no local. Celebro o meu aniversário, há balões, palhaços e um bolo enorme, mudo de sala no infantário e torno-me num perito em desenhos abstractos. O meu Pai está irritável, aprendo-me a não cruzar o caminho dele quando está muito calado, muito sério, as Avós estão preocupadas, gostava que esta história se resolvesse o mais rápido possível, desabafa a Avó Dalena com a Avó São. Também eu, confessa a Avó São, não só por causa do meu filho, mas também por si, a Madalena está a sofrer imenso.  A Avó Dalena suspira, o que é que aquela maluca da minha filha está? Onde é que eu falhei? repete mentalmente, mas não se atreve a dizer isso alto, lê censura nos olhos da outra Avó, ou será imaginação sua? Nessa noite, sente-se mal, o Inspector leva-a para as Urgências, tem que ficar em observação,

O DIÁRIO DO BEBÉ PARTE IV

  Pelos vistos, o corpo da tal mulher não é da minha Mãe, a informação fez a Avó Dalena suspirar de alívio, embora estivesse apreensiva com a viagem complicada do Avô e do meu Pai ao tal País que não sei o nome. Por isso, onde é que ela está? pergunta a tia Matilde, sabemos que ela embarcou, o nome está no manifesto de bordo, por isso, onde é que ela está? repete. Pode estar num hospital de campanha algures, a sofrer de amnésia, sugere o tio Bernardo, pode ter perdido os documentos.... Isso não tem piada, Bernardo, interrompe a tia, mesmo nesse tipo de hospitais, eles tentam identificar as pessoas e encontrar os familiares. Também há outra possibilidade, diz a tia Rita, e todos olham para ela, muito séria, a Clarinha pode ter simplesmente fugido! O caos instala-se na sala, falam todos ao mesmo tempo, oh, Rita, não acredito que tenhas dito isso! exclama a Avó, zangada. Mas a tia Rita até pode ter razão, diz o tio Gustavo muito calmo, gosto muito dele, sorrio-lhe, mas ele não vê e contin

O DIÁRIO DO BEBÉ PARTE III

  Quando entramos na sala, estão todos a falar ao mesmo tempo, muito excitados e a Avó Dalena pergunta, mas o que é que aconteceu? Recebi uma mensagem de um amigo da ONG, explica o Pai, recuperaram um corpo de mulher, pode ser a Clarinha. Não sabes, interrompe a Matilde, ainda não há identificação formal, alguém tem que ir lá... Eu sei disso, Matilde, responde o Pai secamente, eu sei o que tenho que fazer, melhor do que tu! Sou marido dela! E eu sou a irmã, repete a Matilde zangada, basta! soa a voz de comando do Avô Bernardes, temos que analisar a situação calmamente, diz, a única certeza que temos é que há um corpo, um corpo de uma mulher que pode ou não ser a Clarinha. Por isso é que alguém tem que ir lá e identificar, insiste a Matilde, certo, concorda a Teresa, mas a Clarinha é adoptada, como é que a vão identificar? Parece que a Tia levantou uma questão pertinente, ficam todos calados por uns minutos, o que é isso? Adoptada? Mais uma palavra para a minha lista, pensa. Penso que a

O DIÁRIO DO BEBÉ PARTE II

  Olá, olá, mas quem é esta de fato de treino que me desafia para uma corrida contra o aspirador? Deve ser a senhora que vem limpar a casa, ouvi a Avó Dalena dizer ao Pai que é melhor opção, ele precisa de ajuda. A Avó suspira, o Pai confessa abertamente que não tem tempo para isso, mas a Avó diz que trata de tudo. E, aqui entra a D.Filomena que me faz cocegas na barriga e prepara umas sopas fabulosas, creio que segue as instruções das Avós. Este domingo, vamos almoçar em casa da Tia Carolina, ainda estou um pouco perdido a perceber quem é irmão de quem, mas estou rabugento, testo a paciência do Pai até ao limite. Chegamos atrasados, os dois bastante mal humorados, mas o Pai sabe como contornar o assunto e distribui beijinhos, apertos de mãos e sorrisos pela multidão. Sou salvo pela prima Francisca que me leva para a cozinha e me dá a sopa, ouço os adultos rirem-se alto, vai ser uma tarde divertida. Agora, pergunta a Francisca, que achas de uma pequena sesta? e tira-me da cadeira, igno

O DIÁRIO DO BEBÉ

  Ai, mas porque é que têm que estar sempre a fotografar-me com o telemóvel? Vá lá, Francisco, olha para cá...olha, Matilde, não é tão engraçado quando sorri? e eu tenho uma vontade louca de deitar a língua de fora. Não o faço para não ofender as pessoas como disse o meu Pai muito sério uma vez... ele fala comigo como se eu fosse um adulto, ouço muitas vezes a avó criticá-lo por isso. Coitado, nunca esperou ficar sozinho comigo, sei que há uma história qualquer relacionada com a minha Mãe, raramente falam dela. Resumindo: vivo sozinho com o Pai, quando ele está de serviço, fico em casa de uma das avós e se estiver livre ao fim de semana, vamos à natação juntos. Para reforçar os laços entre Pai e filho, explica e eu sorrio... não percebo nada do que ele diz, mas ele sorri também e eu sei que ele fica feliz. A família? Há os avós, os tios e tantos primos que acho que nunca vou decorar nomes, só a Tia Matilde tem quatro! Há também a Tia Teresa, uma mulher gorducha, muito simpática, sempre

O VOLUNTARIADO FIM

  Toma nota mentalmente para falar com a D. Eulália, as duas têm que dar uma limpadela a esta casa o mais depressa possível. O que é a Mãe do Mateus está a pensar? preocupa-se a Madalena, mas a senhora está no quarto do neto, encontrou dois sacos, abriu os armários, está a escolher roupa. A Madalena ajuda-a, o Pai do Mateus aproveitou e despejou o lixo que encontrou e despedem-se na rua, o casal vai buscar o Francisco ao infantário. Tive tanta vergonha ao ver aquela casa tão desarrumada, desabafa com a Teresa, não foi isto que lhe ensinei! Onde é que eu falhei? repete, mas a Teresa abana a cabeça, a partir de certa altura, os filhos voam sozinhos, escolhem outras prioridades! A Sofia até se esquece de comer quando está a escrever um livro, tenho que me impor... A Madalena suspira, não está convencida, a Matilde tem a casa impecável apesar de ter um trabalho absorvente e quatro crianças, diz A D.Eulália está lá para ajudar, mas mesmo assim, há certas coisas que somos nós quem tem que or