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A mostrar mensagens de março, 2021

RECORDAÇÕES - PARTE III

  Desço até ao arquivo central, revejo os processos e ao fim de uma hora, concluo que tenho mais perguntas do que respostas. O que me está a preocupar é o facto do Inspector Leandro ter abandonado a posição inicial e ter sido nesse intervalo para se instalar noutro local que foi baleado. O que é que ele viu? murmuro enquanto subo as escadas. O Meireles está à minha espera, suspira de alívio quando me vê, onde estava? Não tinha o telemóvel consigo? pergunta. Não deve haver rede lá em baixo no arquivo central, respondo, o que é que se passa? Algum problema grave? Telefonaram de casa, a Clarinha fugiu da escola, não sabem onde está, explica o Meireles, já avisei os colegas da zona para irem até à escola, iniciarem as buscas por lá. A esposa espera um telefonema seu. Ok, obrigada, digo, esqueço de imediato o que planeava fazer, o que é que a marota fez desta vez? A Madalena deve estar louca de preocupação! Pensei que as consultas com a psicóloga estavam a resultar, que ela estava mais calm

RECORDAÇÕES - PARTE II

  No dia seguinte, deixo a Madalena em casa e sigo para a Judiciária. Há reunião de Departamento, uma grande seca, confesso. Já passa do meio dia quando entro na sala da Brigada e o Meireles tem novidades. Oh, chefe, lembra-se do gangue do Morto? E do Zé do Laço? pergunta. Claro que sim, às vezes, dava-nos informações e passava a noite nas celas lá bem baixo para "eles não saberem que fui eu quem deu a dica", explico, o Zé do Laço morreu pouco tempo antes do Inspector Leandro, porque é que estás a falar dele agora? Pode ter morrido, diz o Meireles, mas alguém está a usar o nome dele e inspira um certo receio na noite. Tens a certeza? O Zé do Laço era inofensivo, às vezes, estava no local errado com as pessoas erradas, observo, o que é que se passa? O que é que soubeste? Esta pessoa auto-intitula-se Zé "The Big" Laço e comanda as operações a partir da Travessa do Laço, esclarece o meu sargento. Pensei que a Travessa do Laço fosse agora um sítio elegante, escolhido pe

RECORDAÇÕES

  A Madalena dorme cá esta noite. O que é que os nossos filhos dirão se souberem que estamos novamente a namorar? ri-se a minha ex-mulher. Nada, o Gustavo e a Matilde são adultos, vão compreender, o problema será com a Clarinha, respondo e a Madalena concorda. Talvez seja melhor não dizer nada por enquanto, acrescenta, aliás, isto simplesmente aconteceu, amanhã podemos pensar que é uma má ideia e continuarmos a viver separadamente. Um dia de cada vez, digo, é muito bom falar contigo, Madalena, tinha saudades disto! Porque é que deixamos de falar? A responsabilidade, responde a minha ex-mulher, foste promovido, dedicaste toda a tua energia aos casos em aberto e esqueceste de conversar comigo. Fiz isso??? repito e a Madalena sorri, começamos a ficar distantes um do outro e depois, envolveste-te com a tua colega. Isso foi um erro, esclareço um pouco envergonhado. Não digo que não, mas talvez nos tenha ajudado a crescer, a evoluir, estávamos um pouco estagnados, não sei se é a palavra corr

MATILDE - FIM

O idiota riu-se, continua o Gustavo, falou de ter um Pai Juiz, que me podia tornar a vida difícil.  O quê? interrompe a Mãe, esse rapaz é doido! O que é que vamos fazer? Calma, Mãe, não fiquei intimidado, responde o Gustavo, apertei-lhe o braço e falei bem baixinho ao ouvido, talvez o Pai Juiz não gostasse de saber pelo Pai Inspector que lhe está a assediar a filha, porque, decerto, o Pai Juiz já deve ter julgado casos semelhantes. Terá sido correcto? O Filipe não terá entendido isso como ameaça? pergunto, estou preocupada com a reacção do Filipe, não se vingará em mim? Se o fizer, diz a Mãe, aí teremos mesmo que envolver o Pai. Ok, vamos ver o que acontece; espero que o Filipe seja sensato e te deixe em paz! A Clarinha faz mais uma das suas cenas, o Gustavo consegue acalmá-la, vai dar um passeio com ela. A Mãe vai tomar café com a Rita e o Gonçalo, eu fico a terminar o meu projecto. Acabo por ligar à Maria, estás livre? vamos tomar um café ao shopping? tenho novidades e quinze minutos

MATILDE - PARTE V

  A chegada do Gustavo distraí-nos das birras da Clarinha e das discussões com o Filipe. Só conseguimos conversar quando a Clarinha se deita; a Mãe fica preocupada quando sabe do que aconteceu à porta da biblioteca. Isto tem que parar, esse rapaz está louco, diz, não será melhor o teu Pai falar com ele? Acho que piorará as coisas, comenta o Gustavo, é melhor que seja eu. Sabes onde o posso encontrar? É sexta-feira, deve estar no Bar do Luar, explico, mas não vás sozinho! O Filipe é doido e não queres que tenhas uma briga com ele no bar. O Gustavo ri-se, não te preocupes, já telefonei ao Zé Maria e ao Tomás, não vou estar sozinho, responde. Ele saí, eu e a Mãe arrumamos a cozinha, mas tentamos não falar sobre o assunto.  Mas é impossível, o caso é grave e a Mãe está tão preocupada que resolve telefonar ao Pai. Acho que o Filipe entendeu a mensagem, esclarece, é parvo se insistir! Vamos ver o que diz o Gustavo... Se não resultar, e só se não resultar, frisa, é que eu falarei com ele. Já

MATILDE - PARTE IV

  Tenho que admitir, confessa o Gonçalo à Rita nessa noite, a tua sobrinha agiu calmamente, sem medos. Contudo, não sei se será melhor alguém falar com aquele rapaz. Não gostei nada da atitude dele! Embora o Bernardes evitasse falar nos casos em que estava a trabalhar, havia um diálogo aberto sobre esse tipo de assuntos, violência doméstica, raptos, etc, responde a Rita, não me admira que a Matilde estivesse calma e soubesse como agir. Se ainda não pediu ajuda, é porque acha que consegue resolver o assunto sozinha. Mas o Gonçalo não está convencido, vai pedir ao segurança da portaria do escritório para o avisar se o Filipe aparecer nas redondezas. O Gustavo liga-me, desculpa, não te pude ligar mais cedo, tive uma série de reuniões, explica, o que se passa? Conto-lhe resumidamente o que se passou naquela tarde, o meu irmão fica pensativo durante uns minutos. Tomaste a atitude correcta, espero que ele perceba a mensagem, observa, mas de qualquer forma, eu gostava de falar com ele. Achas

MATILDE - PARTE III

  Tocam à campainha; é o vizinho, o filho estuda na mesma escola da Clarinha e hoje, é o dia de lhe dar boleia. Apresso-me a tomar duche, vestir roupa limpa, já estou atrasada. Despeço-me rapidamente da Mãe, parece estar mais calma e apanho o autocarro por um triz. Mesmo assim, chego cinco minutos atrasada, o professor não gosta muito da interrupção, balbucio uma desculpa e a Maria pergunta-me baixinho, onde é que andaste? O Filipe está doido à tua procura. Encolho os ombros, o Filipe não me preocupa agora, concentro-me nas aulas; tenho que me preparar para os exames. Não vejo o Filipe quando saio; tenho que entregar uns livros na biblioteca e depois sigo para o escritório. Hoje, só vou estar lá uma hora, hora e meia, quero acabar um trabalho e toda a informação está no meu computador. O Filipe está à minha espera, encostado à porta do escritório, com um ar furioso. Espera que me aproxime dele e agarra violentamente o meu braço, exigindo saber porque é que não lhe respondo aos SMS. Ond

MATILDE - PARTE II

  Matilde, Matilde, a voz do Pai soa muito distante, mas quando abro os olhos, ali está ele na beira do sofá, com uma mão na minha perna. Olá, adormeci, estou muito cansada, explico, já jantaste? a resposta é negativa e por isso, preparamos qualquer coisa simples para comer. Aviso a Mãe de que não vou jantar, talvez fique a dormir aqui e o jantar decorre sossegado, até ao momento em que o Pai me pergunta pelo Filipe. O Filipe é o meu namorado, é dois anos mais velho que eu, está já a preparar o mestrado e o Pai não confia muito dele. O Filipe é um pouco arrogante, orgulhoso e às vezes, temos grandes discussões, estamos dias sem nos falarmos. Até que eu cedo, procuro-o para discutirmos novamente o assunto e reconciliamos-nos. Mas a verdade é que estou a ficar um pouco aborrecida, de ser sempre eu a fazer cedências, a Rita diz que devo conversar com o Filipe sobre isso, mas ele é perito em esquivar-se a conversas de que não gosta. O Filipe? respondo, está bem, está ocupado com o mestrado

MATILDE

  Estou tão cansada que nem ligo o computador e até tenho trabalhos para terminar. Levanto-me mais cedo, pode ser que a Clarinha esteja mais sossegada e me deixe em paz. Não sei realmente o que se passa com esta miúda; está inquieta, rebelde, torna-se violenta de um minuto para o outro e não sabemos porquê. Não é bem assim; alguém comentou que ela era adoptada e quando reparou que a Clarinha tinha ouvido, ficou destroçada, pediu desculpas que não adiantaram nada. O mal estava feito e a partir daí, a Clarinha, uma menina doce, alegre, transformou-se num verdadeiro Diabo. O divórcio dos Pais, a mudança para um apartamento mais pequeno e a saída do Gustavo para fazer o estágio numa outra cidade também contribuíram para que os problemas de comportamento da Clarinha piorassem. Tens que ter paciência, Matilde, diz a tia Rita, ajudar a Mãe no que for possível. Não posso fazer mais nada, respondo, a Clarinha não ouve ninguém e tenho que me conter para não lhe dar uma bofetada quando ela começa

O MARIDO - FIM

  Estamos a meio do último capítulo do segundo livro quando as águas da Carolina rebentam. Fico desnorteado, até parece que não passei por isto quatro vezes, procuro frenético as chaves, que estão já no bolso do casaco. O Miguel chega nesse momento, foi jantar com uns amigos, quer vir connosco, mas não, filho, tens que ficar com os teus irmãos, peço. Conduz com calma, aconselha a Carolina, isto ainda demora um bocado e chegamos ao Hospital sem problemas. A médica de serviço examina-a, ainda não fez a dilatação toda, diz e eu fico na sala de espera, estás muito nervoso, não te quero ao pé de mim, observa a Carolina. Meia hora mais tarde, aparecem a Teresa e o Pedro, o Miguel telefonou-nos, está muito preocupado, comenta a minha cunhada. Amanhã é dia de trabalho, isto ainda vai demorar, dou notícias logo que souber, insisto, mas os meus cunhados abanam a cabeça, a Carolina é nossa irmã, esperamos aqui contigo. Agradeço-lhes com o olhar, a Carolina tem toda a razão, estou muito nervoso, s

O MARIDO - PARTE V

A tensão da Carolina está um pouco elevada, o médico aconselha repouso, evitar situações de stress e já em casa, enquanto a ajudo a ficar confortável, sugiro que não se envolva tanto nos projectos, supervisione apenas. Não sei se consigo, admite a minha mulher, são projectos importantes, ok, mas não disseste que a tua assistente é muito competente? pergunto, por isso, tens uma reunião diária com ela para estares ao corrente e corrigires o que for necessário, mas nada de visitas a clientes, almoços tardios. A Carolina fica um pouco relutante, mas sinto que está aliviada, confessa mais tarde à irmã que vai pôr a leitura em dia. O Miguel fica preocupado, tens a certeza de que não vai acontecer nada? insiste e eu suspiro, tento acalmá-lo, o que não é fácil, pois eu tenho as minhas próprias dúvidas. A situação está controlada, filho, vamos ajudar a Mãe a ultrapassar isto, respondo, conto contigo para manteres o Matias e o Edgar na linha. Nada de correrias, gritos selvagens. A Filipa e a D.M

O MARIDO - PARTE IV

A Carolina está um pouco apreensiva, estou preocupada e convido a minha cunhada Teresa para tomar um café e conversar um pouco. A Teresa assegura-me que a Carolina está feliz, não estava realmente nos planos dela ser Mãe novamente, diz, mas é tudo uma questão de organização, é o que está a fazer. Acho que os miúdos, tenho mesmo que deixar de lhes chamar miúdos, confesso, estão a fazer o mesmo. O Matias e o Edgar ainda têm algumas dúvidas, querem que seja um rapaz, não têm tempo para ensinar uma rapariga. A Teresa ri-se, sossega, vai correr tudo bem e eu estou aqui para ajudar no que for preciso. Fico um pouco mais sossegado, mas vigio discretamente a Carolina, tento poupá-la ao máximo, sei que estou a pedir demais à Filipa, mas quero que corra tudo bem. O Miguel encarrega-se dos irmãos, demonstra uma grande capacidade de liderança e há sempre discussões, porque o Matias e o Edgar protestam com algumas das regras impostas. Mas se tivermos o quarto arrumado e os trabalhos feitos, podemos

O MARIDO - PARTE III

  Não, isto não está correcto, digo após ler cuidadosamente a lista, vocês não sabem que pode ser uma irmã? Só escreveram nomes de rapazes. Oh, responde o Matias, tem que ser um rapaz. As raparigas são inúteis. A Filipa dá-lhe uma sapatada na cabeça, ai, sim? espera lá, nem sabes o que te vai acontecer a próxima vez que quiseres ir ao parque! observa. O Matias encolhe os ombros, nada aborrecido, há sempre o Miguel! comenta. Queres fazer o favor de estar calado e de pedires desculpa à Filipa? Nesta casa, não se admitem faltas de respeito, preciso de repetir tudo novamente? interrompo. O Matias fica envergonhado, desculpa, Filipa e tenta arrumar as folhas de papel. O Miguel tira-lhas, começa a recitar os nomes com um ar trocista, Amadeu? Julião? Nenhum irmão meu se vai chamar assim, declara. A Filipa ri-se, onde é que vocês foram arranjar estes nomes? Escolham qualquer coisa simples, como Diogo, sugere. Ou Pedro, proponho e a Carolina sorri, Bernardo também é bonito, intervém. O melhor é

O MARIDO - PARTE II

A Carolina olha-a seriamente, os irmãos baixaram os olhos para o prato, já perceberam que a Mãe não gostou do comentário. Não, diz calmamente, realmente não pensei nisso. Pensei na minha saúde, na saúde do bebé e como temos que gerir esta família a partir de agora. Isso é mais importante do que o facto de teres trinta e seis anos e te sentires envergonhada por teres um irmão ou uma irmã com dezoito! concluí. A Filipa cora, abre a boca para responder, mas faço-lhe sinal para ficar calada. Foi realmente um comentário infeliz, explico-lhe quando ficamos sozinhos na cozinha. Hoje é a nossa vez de arrumarmos a cozinha, temos uma governanta, mas ela saí às oito da noite e a Carolina organizou um quadro de tarefas. Vais ficar envergonhada por teres um irmão ou uma irmã dezoito anos mais novo? pergunto e a Filipa abana a cabeça. Não foi bem isso o que quis dizer, responde, mas tens que concordar que é um bocado estranho, voltarem a ser Pais nesta altura. Talvez seja, não estávamos realmente à

O MARIDO

  Ter cinco filhos nunca fez parte dos meus planos. Tanto eu como a Carolina temos irmãos, tivemos uma infância feliz e ter só um filho nunca foi considerado. A verdadeira surpresa foi o Matias ter nascido quase onze anos após a Filipa e o Edgar quinze meses mais tarde. Aprendemos a gerir o caos, apelamos ao bom senso dos mais velhos para tomarem conta dos irmãos e a vida entrou numa rotina normal. Não estávamos preparados para a nova gravidez da Carolina dezoito anos depois da Filipa e fomos gozados carinhosamente pela família e pelos amigos mais próximos. Afinal, não perderam o jeito, ou apanham-se sozinhos e cá está o resultado, foram alguns dos comentários bem humorados. Porque aconteceu durante um dos raros fins de semana em que eu e a Carolina estivemos verdadeiramente sozinhos na casa da praia, sem obrigações e sem filhos. Quando descobriu, a Carolina ficou um pouco alarmada, lá vamos nós voltar aos biberões e às noites mal dormidas, diz, e qual será a reacção dos miúdos? A Fili

FRANCISCO - FIM

  Estás bêbedo ou quê? o Francisco está zangado, está cansado, não precisa de ouvir este tipo de comentários do irmão. Não, só estou a dar uma opinião, diz o Frederico, se não gostas de ouvir as verdades... Mas qual verdade??? Não vives aqui, não sabes o que se passa verdadeiramente, protesta o Francisco, ok, a Maria tem os seus defeitos, mas tu também e devem ser grandes para a Catarina, que tem cabeça, tronco e membros, te deixar. O Frederico abre a boca de espanto, nunca o irmão lhe falou assim, foram sempre grandes companheiros. Vou-me embora, tu não estás bem, anuncia, amanhã vais ver que tenho razão e saí, convencido que é dono da verdade. O Francisco suspira, tem tido tempo para pensar e realmente, tomou decisões muito erradas, principalmente no que diz respeito à Maria, como é que lhe escapou o facto dela ser tão superficial? Como é que não percebeu que ela teve o David, apenas porque ele insistiu nisso? Estou perdido, confessa, apaga as luzes, vai ver o filho que dorme e acaba

FRANCISCO - PARTE IV

No dia seguinte, há uma reunião: a Mãe e dois dos irmãos da Maria estão presentes, o Major e a Glória também vieram e a Catarina oferece-se para tomar conta dos miúdos. Também quero a tua opinião, observa o Francisco, mas a cunhada aperta-lhe o braço em solidariedade e desaparece no quarto do bebé. O Frederico é o último a aparecer, estou aqui para te apoiar, pá, diz, mas não percebo porque é que isto é tão grave, ela aparece dentro de uma ou duas semanas. O Francisco nem lhe responde, a situação é grave, não pode ser tratada com indiferença. O Leonardo, um dos irmãos da Maria, acha que a primeira coisa a fazer é conversar com os colegas de trabalho, talvez ela lhes tenha dito alguma coisa, talvez se descubra o porquê deste absurdo, acrescenta. O Major concorda, mas aconselha também uma visita ao bar onde, supostamente a Maria esteve na noite de sexta-feira, os amigos podem não se ter apercebido, mas os barmen estão sempre atentos e visto qualquer coisa fora do normal, comenta. Falamos

FRANCISCO - PARTE III

  A Mãe não sabe nada, também recebeu um SMS, mas a partir daí, o silêncio é total. Está a telefonar a toda a gente de que se lembra, comparam notas, mas sem resultados. Parece que a Maria desapareceu da face da Terra, diz a Mãe destroçada e os irmãos também estão perdidos. Ao fim da tarde, continuam sem terem notícias da Maria, o Francisco é convidado para jantar, a sogra já deu banho e o jantar ao David. Se quiseres que ele fique cá, não há problema, observa a avó, mas o Francisco acha melhor ir para casa, a Maria pode ter regressado entretanto. Se estiver, manda-me um SMS, pede a sogra, eu quero ter uma conversa com ela! Mas a casa está às escuras, o Francisco deita o bebé com todo o cuidado e volta para a sala. Não sabe o que deve fazer, telefonar à polícia? mas nem sequer sabe onde é que ela passou a noite e com quem. Em cima da mesa da cozinha, está um bilhete. O Francisco reconhece a letra da Maria e apressa-se a ler. É muito curto, diz apenas que está " farta da vida medío

FRANCISCO - PARTE II

O Major atende o telemóvel de imediato, se está surpreendido, não o diz, fala como se tivessem visto ontem. O Francisco está um pouco perdido, acha que não está a ser coerente, mas confessa ao Pai que não sabe o que fazer, está cansado demais. O Major fica calado uns minutos, sabes onde foi a Maria? pergunta e o Francisco suspira, suponho que foi ter com uns amigos dela, ao bar do Cais, mas não me apetece ir até lá. E, depois, o bebé já adormeceu e não o vou deixar sozinho, acrescenta. O Pai hesita, acha que ele e a Maria deviam conversar melhor, esclarecer o assunto, mas o melhor talvez seja o Francisco ficar em casa, tentar dormir. Amanhã, vem tomar o pequeno almoço comigo, lá para as dez na confeitaria do parque, sugere o Major, conversamos melhor nessa altura. O Francisco agradece, desliga e acaba por adormecer no sofá no quarto do filho.  Entretanto, o Major conta a conversa que teve com o filho à Glória. A companheira tem vontade de dizer bem feito, mas o Major está visivelmente

FRANCISCO

  O Francisco está cansado e mentalmente, faz a lista das preocupações. A primeira é o facto da Maria não estar minimamente interessada no filho e a responsabilidade ter caído nos ombros do Francisco. Não o quis amamentar, tenho que recuperar a forma rapidamente, diz e passa a maior parte do tempo no ginásio, no spa, no nutricionista, tudo para voltar ao normal. Se o bebé chorar de noite, ela não faz qualquer esforço para se levantar e acalmá-lo. Se não fosse a sogra, o Francisco não sabia o que fazer, até na vida diária da casa, a Maria está desleixada e ele teve que aprender a cozinhar o básico. Tentou chamá-la à razão, a discussão foi violenta e a Maria acaba por confessar que não queria ter aquele filho, que não se sentia preparada, mas ele ficou tão contente que não teve coragem de lhe dizer não. O Francisco fica chocado, tinhas apenas que conversar comigo, não sou um monstro, podíamos ter o miúdo mais tarde, comenta. Não sei se o quereria ter mais tarde, explica a Maria, a verdad

A FESTA - FIM

  A terapia também é uma boa opção, o Pedro fala de coisas que nunca abordou com as irmãs, elas são excelentes, afirma, somos os Três Mosqueteiros, mas elas têm as suas próprias vidas, não quero interferir. O Miguel está a modificar-se, a educadora diz que já participa nas brincadeiras dos outros, embora, de vez em quando, ainda se isole e fique amuado se a situação não lhe for favorável. A conselho do psicólogo, o Pedro pede aos sogros para visitarem o Miguel na cidade, o rapaz está a fazer progressos, explica, é melhor que estejam com ele em locais conhecidos. Os sogros não dizem nada, aparecem para passar uns dias com eles, a Laura não quis vir e o Pedro percebe que isso os angustia imenso. O Miguel até aprecia a visita dos avôs, eles acham que está mais simpático, mais falador e conhecem a Beatriz que os encanta. Não vou dizer nada à Laura, observa a sogra quando se despede, provavelmente não vai ligar ao assunto, mas quero falar primeiro com o médico. Dito isto, acrescenta, estou

A FESTA - PARTE V

  As minhas irmãs tinham razão, confessa ao Pedro à Beatriz na sexta-feira seguinte. Convidou-a para jantar em casa dele, o Miguel está calmo e adormeceu rapidamente. A Laura passou a maior parte do tempo na loja, pouco falava quando se sentava à mesa para comer, continua o Pedro, e o Miguel escondia-se quando a via. Não teve o gesto de carinho nem uma palavra, nada! A Mãe do meu filho tornou-se numa desconhecida até para mim! A Beatriz sorri, é um homem muito ferido, tenho que ser cuidadosa no que digo, penso e em voz alta, não será uma boa ideia tu fazeres também terapia? sugere. Eu? Porquê? o Pedro está admirado e a Beatriz bebe um golo de vinho antes de explicar, estás magoado com a situação, sentes-.te pressionado, talvez falando sobre isso, fiques mais à vontade, relaxado. Estou a falar contigo, falo com as minhas irmãs, justifica o Pedro e a Beatriz volta a sorrir antes de continuar, mas talvez não seja suficiente. Não podes ser tu? e o Pedro sorri. A amiga ri-se, não, não acho

A FESTA - PARTE IV

  O jantar é agradável, o Pedro sente-se a relaxar, tanto mais que a pessoa que se sentou ao lado é bem divertida. Não deve ter mais do que trinta e cinco anos, tem uns bonitos olhos verdes e o riso é contagiante. Só quando trocam os números de telemóvel é que o Pedro sabe que ela é psicóloga. Talvez o possa ajudar, mas o Pedro decide não o fazer; afinal, acaba de a conhecer. Contudo, cruzam-se no parque duas semanas depois; o Miguel está muito zangado, está a fazer uma grande birra e o Pedro não sabe o que fazer. Olá, diz uma voz por trás dele, o que se passa? e o Pedro depara com a Beatriz, a psicóloga que conheceu no jantar dos amigos. Olá, não sei, hoje, ele está muito irritado e sinceramente, não sei o que fazer, confessa o Pedro, mas a Beatriz ajoelha-se em frente do Miguel, fala-lhe baixo e calmamente. O Pai vê o Miguel olhar desconfiado para a Beatriz, mas depois, deixa que ela o ajude a levantar-se e o instale no banco de areia. Em breve, o Miguel está a construir um castelo e

A FESTA - PARTE III

Oh, Teresa, estás doida! Ele é um bebé! protesta o Pedro, vou lá levá-lo a um psicólogo. Parece que não queres encarar a realidade, diz a Teresa, olha para ali e aponta para a sala onde o Matias e o Edgar organizaram um jogo para divertirem os mais pequenos. O Miguel continua sentado sozinho a um canto, amuado e afasta a mão do Edgar quando este tenta levá-lo para o circulo. Isto não é saudável, e já pensaste no que poderá acontecer quando ele for para a escolha? continua a Teresa e a Carolina está calada, não sabe verdadeiramente o que dizer, há uma certa lógica no que a irmã está a dizer. O Pedro encolhe os ombros, senta-se com um suspiro numa das cadeiras da cozinha e repete, não sei o que fazer, tem medo de tudo, mesmo no parque, não larga a minha mão! Não tenho uma resposta concreta, cada miúdo é um miúdo, a Filipa era muito obediente, mas o Miguel era um rufia, explica a Carolina, mas quando nasceram o Matias e o Edgar, tornou-se numa pessoa muito responsável e eles obedecem-lhe

A FESTA - PARTE II

A Filipa tem que concordar que a sala está muito bonita. O Matias e o Edgar fizeram uns painéis muito engraçados, estenderam no chão uma manta de retalhos, decerto foi a Teresa quem a emprestou, é mesmo do género dela, pensa. Há balões, serpentinas, trouxeram todas as almofadas coloridas que encontraram e os dois estão muito sorridentes. A Teresa seguiu as sugestões dos sobrinhos e mascarou os filhos como anões. Como sempre, a Sofia só sorri e o Gonçalo está encostado a uma almofada de olhos fechados, mas a Filipa não tem a certeza de que está a dormir. A rainha da festa apanhou um balão, aperta-o demais e este rebenta. A Inês faz beicinho, mas a Sofia ri-se e dá-lhe outro. A campainha toca, chega o Pedro com um Miguel muito calado. Valha-me Deus, este nosso sobrinho está sempre de mau humor, murmura a Teresa e a Carolina suspira. O Miguel resiste, não se quer sentar na manta e brincar com os primos e o Pedro leva algum tempo a convencê-lo. O rapaz acaba por se sentar a um canto, longe

A FESTA

Á hora de almoço, discutem-se os planos para a festa. A Inês faz dois anos, a Carolina não quer deixar passar a data em branco e o Miguel protesta, ela quer lá saber! É um bebé! Está calado! intervém a Filipa, tu não percebes nada! e a discussão teria sido violenta se a Carolina não os interrompesse. Calma! Preciso de ajuda, de ideias para a festa, diz a Mãe e o Matias responde, bolo e velas. Isso sabe-se, idiota! repreende o Miguel, a Mãe refere-se a um tema. Que tal a Branca de Neve e os Sete Anões? propõe o Edgar, é a história que ela gosta mais. Os outros riem-se, como é que tu sabes? mas a Carolina até acha uma boa ideia, podemos pedir aos meninos que venham fantasiados. Vou sugerir à Laura que vista o Miguel de Zangado, observa o Miguel, aquele rapaz está sempre zangado! Que crueldade, Miguel! protesta a irmã, mas o Matias concorda com o irmão, o Gonçalo pode vir vestido de Soneca. Acabam todos por se rir e a Inês também, embora não compreenda bem o motivo. A Teresa ri-se quando